
Desde abril deste ano, todos os donos de negócio que aceitam cartão de crédito ou débito como meio de pagamento foram impactados pela Resolução 264 do Banco Central. A norma substituiu a Circular 3952 e define regras sobre o registro e utilização de recebíveis de cartões em antecipações, empréstimos e outras operações de crédito.
Mas qual é o impacto disso no dia a dia? Na prática, a Resolução 264 possibilita maior oferta de produtos e serviços para os estabelecimentos. Isso significa que é possível utilizar a agenda de recebíveis de cartões de crédito e débito para negociar e selecionar as condições mais vantajosas de concessão de crédito.
Como é de se esperar, uma nova resolução pode gerar uma série de dúvidas. Por isso, a Software Express reuniu os principais pontos que você deve ter em mente. Leia a seguir!
Entendendo as Unidades de Recebíveis (UR)
Um dos conceitos mais importantes introduzidos pela Resolução 264 é a UR, ou Unidade de Recebíveis. Podemos considerá-la como uma espécie de moeda de negociação que poderá ser utilizada na hora de contratar serviços ou produtos financeiros para o negócio, como aquele empréstimo para reformar a loja.
Cada UR tem suas próprias características, que basicamente são a maneira como se organiza o dinheiro que é obtido através de vendas com os cartões. Na prática, é assim: se o cliente gastar R$ 200 em uma loja, descontada a taxa de administração, o estabelecimento tem um recebível de um valor um pouco menor que R$200. As UR, no entanto, são agrupadas conforme as características dos recebíveis. E cada grupo é formado quando possui recebíveis:
- Do mesmo estabelecimento (CNPJ completo ou CPF);
- Da mesma credenciadora (aquela que te fornece a maquininha de cartão);
- Da mesma bandeira (ex.: Mastercard, Visa, Elo, Amex);
- Do mesmo produto (crédito ou débito);
- Que serão pagos numa mesma data.
Confira um exemplo: em 04/03/2024, foram realizadas duas vendas de crédito à vista da Mastercard, a primeira venda foi de R$100 e a segunda foi de R$200. Supondo uma taxa de administração de 2%, o valor líquido para pagamento em 04/04/2023 será, respectivamente, de R$98 e R$196.
Somando-se ambas, teremos a UR no valor de R$294. Se no mesmo dia for feita uma venda pela bandeira da Visa, por exemplo, esse valor não se somará à UR de R$294, mas será destinado a uma nova UR, uma vez que a bandeira é diferente.
Como utilizar as URs a seu favor
Cada venda feita gera créditos com base em características específicas e esses créditos são registrados pelas credenciadoras no ecossistema do Banco Central, através de uma registradora autorizada pelo próprio Bacen, no dia seguinte à data da venda. Isso permite que as URs sejam negociadas quase como dinheiro.
Por isso, com o novo formato dos recebíveis em UR, ficou muito mais fácil para os donos de estabelecimentos terem acesso a crédito com condições mais vantajosas, já que agora é possível usar os recebíveis como garantia.
Essa é a chance de tirar do papel aqueles desejos que exigem dinheiro mesmo que o dono do estabelecimento ainda não tenha os valores em caixa. Abrir uma nova filial, investir na contratação de mais pessoal, fortalecer as estratégias de marketing ou aumentar custos de operação são apenas alguns dos possíveis usos. A depender do objetivo, o varejista deve avaliar as melhores formas de negociação, levando em conta os tipos de contrato de crédito, como explicaremos a seguir.
Tipos de contrato de crédito: gravame ou cessão
Existem alguns modelos de contrato de crédito, entenda o que acontece em cada um deles:
Gravame
Se você já financiou um carro, provavelmente já está familiarizado com a palavra gravame. A lógica é parecida: quando um comprador adquire um carro através de financiamento com banco, o carro é a própria garantia que a instituição financeira tem caso o comprador não pague as prestações do financiamento. Com gravame de recebíveis de cartões, o dono do estabelecimento pode pegar crédito dando como garantia suas URs. O que significa que as URs só serão debitadas pelo financiador caso o pagamento do financiamento não seja honrado.
As taxas envolvidas neste contrato podem ser mais baixas por causa dessas URs, já que elas demonstram que a loja tem recebíveis, o que gera mais segurança para o financiador.
Cessão
A cessão é um outro tipo de operação que um estabelecimento pode contratar e ter um dinheiro rápido em caixa, mediante desconto de alguma taxa. Na cessão, o empreendedor vende as URs para o financiador. Com isso, o pagamento dessas Unidades de Recebíveis será feito diretamente para o financiador, uma vez que o dono do negócio já recebeu o valor antecipado.
Compensação de débitos
Vamos imaginar que o varejista já usou suas URs para concessão de crédito. Diante desse cenário, é importante entender as novas regras que a Resolução 264 atribui para cancelamentos, taxas de aluguel da maquininha, chargebacks e outros débitos na agenda de pagamentos.
Antes da Resolução 264, os débitos eram efetuados com base no saldo disponível. Por exemplo, se a agenda tinha um saldo de R$1000 e chegava o dia de pagar o aluguel da maquininha, de R$ 100, esse valor era descontado da agenda deixando o saldo em R$900. Quando o saldo não era suficiente, os débitos ficavam pendentes até que o estabelecimento realizasse novas vendas.
E o que muda com a resolução 264? Se as URs foram utilizadas para contratar operações como gravame ou cessão, a capacidade de pagar esses débitos depende dos acordos feitos com o financiador ou credenciadora.
Os débitos, como aluguel da maquininha, cancelamento e chargebacks, reduzem o valor das URs, o que pode ou não gerar prejuízo ao financiador que negociou essas Unidades de Recebíveis. Por isso, foram criadas duas regras pelo Banco Central que envolvem contratos de crédito:
1ª restrição:
As URs registradas que tenham sido negociadas sobre um determinado percentual não podem ser usadas para compensação de débitos, mesmo que o percentual seja inferior a 100%.
Por exemplo, o aluguel da maquininha é de R$100 e o saldo disponível na agenda é de R$1.000, composto por 10 URs de igual valor. Porém, 50% do valor dessas URs foi dado como garantia em uma operação de crédito. Então, o aluguel não poderá ser compensado em nenhuma dessas URs. Se o estabelecimento tiver negociado toda a sua agenda nessas condições, o aluguel será compensado apenas quando forem realizadas novas vendas. Do contrário, a dívida ficará pendente.
2ª restrição:
As URs registradas que tenham sido negociadas sobre um valor pré-definido podem ser usadas para compensação de débitos, desde que a ela seja feita apenas nos valores livres das URs.
Por exemplo, houve uma cessão de R$1.000 sobre uma UR de Crédito da Bandeira X no valor de R$1.500 que vence em 04/12/2024. Nesse caso, o valor máximo do débito a ser compensado nessa UR é de R$500, pois os demais R$1.000 já estão comprometidos com o financiador. Se ocorrer um chargeback de R$800 e o estabelecimento não tiver mais nenhuma UR na sua agenda, apenas R$500 serão compensados, enquanto R$300 ficarão pendentes.
Pontos muito importantes em função dessas restrições:
- É possível que o estabelecimento tenha um saldo de agenda com valor suficiente para cobrir uma dívida, mas este saldo não pode ser utilizado para pagar a dívida;
- É possível que uma dívida seja paga muito tempo depois, até que novas vendas sejam realizadas, ou que o contrato seja quitado.
Exceções à regra
Há uma exceção na aplicação dessas restrições, que é exclusiva para o débito de chargeback ou cancelamento de venda.
O cancelamento e o chargeback estão vinculados a uma determinada venda. Cada venda, no valor líquido está agrupada em alguma UR. Dessa forma, podemos pensar num vínculo direto entre o cancelamento ou chargeback de uma venda e sua respectiva UR. Chamamos essa UR de “UR original”, pois ela é composta pela venda que originou o cancelamento ou chargeback.
Por exemplo, há 3 vendas que formaram uma UR de Crédito da Bandeira Y que vence em 04/04/24: uma venda de R$100, uma de R$200 e uma de R$300. Descontando uma taxa de administração de 2%, a UR terá o valor de R$588. Essa UR foi vendida para o financiador, mas em 30/03/24 ocorreu o cancelamento da venda de R$300. Nesse caso, será feita a compensação desse cancelamento na UR.
Se a UR original ainda não foi paga, seu valor poderá ser utilizado para compensação desse cancelamento ou chargeback, mesmo que a UR já tenha sido utilizada em operações como gravame e cessão.
Resumindo as mudanças da Resolução 264
Como você pode ler, a Resolução 264 do Banco Central trouxe mudanças significativas para os donos de negócios que aceitam pagamentos com cartões de crédito e débito ao introduzir a Unidade de Recebíveis (UR) como um mecanismo importante na negociação de crédito. Com as novas regras, os estabelecimentos podem utilizar seus recebíveis de forma mais eficiente, seja como garantia em contratos de gravame ou através da cessão, proporcionando acesso a melhores condições de crédito.
No entanto, é essencial que os empresários compreendam as restrições e exceções impostas pela resolução do Bacen, especialmente em relação à compensação de débitos. Dessa forma, podem otimizar suas estratégias financeiras e aproveitar ao máximo as oportunidades oferecidas por essa nova regulamentação.
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